Por Marcelo Copello
Você sabia que alguns dos champagnes de maior prestígio tem passagem por barricas de carvalho? E que alguns dos melhores espumantes brasileiros também?
Uma pergunta fundamental que um enólogo que elabora espumantes deve se fazer é: madeira ou inox? Esta resposta é um divisor de águas no mundo das borbulhas. Não há certo ou errado, mas sim uma questão de estilo.
Vamos entender como funciona este processo, como ficam e quais são os principais champagnes e espumantes barricados.
HISTÓRICO
Não custa lembrar que quando falamos “champagne” referimo-nos exclusivamente aos vinhos elaborados na região francesa que leva este nome, e que quando usamos “espumante” nos referimos de forma genérica à vinhos com borbulhas de qualquer região do planeta.
Hoje o padrão mundial para elaboração de qualquer espumante é ZERO contato com madeira, utilizando recipientes de aço inoxidável. Os que passam por madeira são minoria, mas nem sempre foi assim.
Fermentação em madeira era o padrão na região de Champagne no passando, normalmente em grandes recipientes de carvalho com muitos anos de uso e sem tosta. Isso antes da invenção do inox e seu uso no vinho, que tomou impulso após a Segunda Guerra Mundial, nos anos 1950.
Foto Pátio da Maison Krug em Reims
COMO SE ELABORA UM ESPUMANTE BARRICADO
Há várias maneiras da madeira estar persente na elaboração de espumantes:
O vinho base pode apenas fermentar em recipientes de madeira
O vinho base pode amadurecer (após a fermentação) em madeira
O licor de expedição pode amadurecer em madeira
Importante sempre lembrar que há mil variações neste processo, pois a madeira pode ser nova ou usada (o mais comum), com ou sem tosta, e apenas uma parte do vinho pode passar por madeira, enquanto o maior volume está em inox. O processo pode ainda variar com realização ou não de bâttonage (mistura do vinho na barrica com bastão, para ganhar cremosidade) e submeter o vinho ou não à fermentação malolática (desacidificação), que pode ocorrer ou não na barrica.
Em Champagne as madeiras são neutras, os recipientes são grandes, com muitos anos de uso e sem tosta.
ESTILOS - O QUE MUDA NO SABOR
Quando o enólogo decide usar ou não madeira em seu espumante está optando basicamente entre dois estilo: oxidativo X redutivo. No primeiro, o vinho tem contato com micro porções de oxigênio, através dos poros da madeira, enquanto no segundo, o vinho é totalmente protegido deste contato.
O resultado é, com madeira: mais complexidade, aromas mais secundários (como madeira, leveduras, manteiga, brioche, tabaco etc). Sem madeira, em um estilo redutivo, o espumante tem mais aromas mais primários como frutas, mais pureza, frescor e precisão
A micro-oxigenação dada pela madeira funciona também como uma espécie de vacina contra a oxidação, dando mais longevidade ao espumante. Obviamente, assim como nos vinhos sem bolhas, madeira nova ou em demasia pode ser invasiva e descaracterizar totalmente a bebida.
QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS CHAMPAGNES BARRICADOS
Como já tido, nas últimas décadas o padrão mundial tornou-se o inox, a madeira é exceção. Contudo, alguns Champagnes míticos tem toda sua produção fermentada em barricas, como:
Krug - www.krug.com (100% da produção fermenta em barricas bem antigas);
Jacques Selosse (todos fermentam em carvalho, com 10% de madeira nova);
Bollinger - www.champagne-bollinger.com (fermentam em barricas antigas, apenas os Vintages);
Louis Roederer - www.louis-roederer.com (vinhos de reserva, incluindo os usados no Champagne Cristal, ficam armazenados em carvalho usado).
Outros grandes nomes usam madeira, se não em toda a a produção, usam de alguma forma a madeira em seus rótulos mais especiais, como:
Billecart-Salmon www.champagne-billecart.fr (Clos Saint Hilaire),
Drappier (Grande Sendrée),
Gosset - www.champagne-gosset.com (Grande Réserve),
Philipponnat - www.philipponnat.com (Clos des Goisses),
Nicolas Feuillatte - www.nicolas-feuillatte.com (Cuvée 225),
Bruno Paillard - www.champagnebrunopaillard.com (Nec Plus Ultra),
Taittinger - www.taittinger.com (Comtes de Champagne).
Talvez você já tenha provado alguns destes champganes sem ter notado madeira – ponto para os enólogos.
Madeira nos espumantes, na maioria das vezes é imperceptível, e assim é o ideal.
Leia sobre minha visita à KRUG em: http://www.marcelocopello.com/post/krug-mais-que-champagne-uma-paixao
ESPUMANTES BRASILEIROS
No Brasil o panorama é análogo à champagne, o padrão é o inox, mas nomes importantes usam madeira.
A Vinícola Geisse ( www.cavegeisse.com.br ), maior nome especializado em espumantes no Brasil, usa em apenas um produto, o Cave Geisse Terroir Rosé. “O vinho base faz fermentação alcoólica e malolatica em barricas francesa de segundo a terceiro uso” conta Carlos Abarzaú, enólogo responsável. “Fazemos isso em câmara fria, para controlar a temperatura fermentação e posteriormente os vinhos base ficam por mínimo de 4 meses na barrica, realizando bâtonnage”, complementa.
A Valmarino (www.valmarino.com.br ) tem a madeira nova bem evidente em alguns de seus produtos. Segundo o proprietário, Marco Salton, o Valmarino & Churchill Prestige Nature “usa para o vinho base sempre com barrica nova, por cerca de 6 meses, enquanto no Valmarino & Churchill Extra Brut seu vinho base fica 1 ano e barricas de 2o a 5o”. Em ambos os casos o vinho não sofre malolática e apenas amadurece, mas não fermentam, na madeira, que é sempre carvalho americano. A empresa usa madeira ainda em um 3o produto, o Valmarino Nature, cujo licor de expedição leva brandy com 5 anos em barricas de carvalho.
Licor de expedição barricado também é utilizado na Vinícola Miolo ( www.miolo.com.br ), empresa referência em nossa indústria. Lá nenhum espumante é barricado mas, segundo Adriano Miolo, enólogo chefe, “eventualmente utilizamos algum licor de expedição que parte amadurece em barricas de carvalho”.
O espumante Viapiana 575 dias Nature, é outro exemplo de borbulha nacional barricada. Este vinho foi eleito em 2016 como melhor espumante Brut do Brasil pela GRANDE PROVA VINHOS DO BRASIL. A Viapiana ( www.vinhosviapiana.com.br ) uma vinícola boutique de Flores da Cunha-RS, vinifica os vinhos base de seus espumantes em inox e os da linha prêmios (este Brut e um rosé), amadurecem em barricas, bom bâttonage mas sem malolática.
Os espumantes da Casa Valduga ( www.casavalduga.com.br ) estão sempre entre os melhores do Brasil e com um estilo bem característico, rico em aromas secundários. “Muitos acham que há madeira onde de fato não há, dado o perfil aromático dos nosso espumantes”, conta Daniel Dalla Vale, enólogo da empresa. A Valduga usa pouca madeira e com muito cuidado apenas no Espumante Gran Reserva e no 130 (de 5% a 8% do vinho base passa 1 ano em barrica, com bâttonage, sem malolática). A Valduga se prepara, contudo, para lançar uma nova linha de espumantes: “estamos com um lançamento para sair em breve, de espumantes com passagem por madeira nova. Aí sim a intensão será de ter o carvalho aparecendo”, complementa Daniel.