Por Marcelo Copello
A Provence e Côte d´Azur têm sua produção de vinhos dominada pelos rosados, de consumo imediato, leves, frescos e descompromissados. A excessão está em Bandol, uma das mais antigas denominações de origem dos vinhos da França, que produz grandes tintos (outra excessão é a AOC Bellet, com ótimos tintos, próxima a Nice). Localizada junto ao mar, próxima a vila histórica de La Ciotat, onde está o primeiro cinema da história, Bandol é conhecida por seus potentes e longevos tintos, nos quais domina a casta Mourvèdre. Em recente viagem, a região a BACO visitou seus dois produtores de maior prestígio, verdadeiros Grand Crus privençais, a Domaine Tempier e o Château de Pibarnon. Outros nomes de que mercem atenção em Bandon são: Château Pradeaux, Domaine Bunan, Château de la Rouvière, Domaine de la Tour du Bon e Domaine de Terrebrune.
Domaine Tempier
Fundada em 1834, a Domaine Tempier (www.domainetempier.com - ainda sem representante no Brasil) tomou novos rumos quando Lucie Tempier se casou com Lucien Peyraud e recebeu de presentede seu pai esta propriedade. Lucie, mais comnhecida como Lulu é uma conhecida gastrônoma, com livros especializados na harmonização dos vinhos locais. Hoje aos 96 anos de idade ela se orgulha de não beber água... Lucien Peyraud é tido como o "pai de Bandol", pois foi ele quem definiu junto a I.N.A.O. (Institut National des Appellations d’Origines) as regras da A.O.C.Bandol, que viria a ser decretada em 1941.
Com a morte de Lucien em 1996 quem está à frente da Domaine é o talentoso enólogo Daniel Ravier, que nos recebeu na propriedade para uma extensa prova, incluindo diversas amostras de tonél e safras antigas (veja adiante).
O trabalho de Ravier é exemplar, desde os vinhedos. Os cerca de 40 hectares da empresa estão em terraços pedregosos, em forma de anfiteatro, próximos ao mar. Aqui quem reina são vinhas velhas, algumas de mais de 50 anos, da Mourvèdre, casta temperamental, que só rende bem em terroirs ensolarados e marítimos. Também estão plantadas Grenache, Cinsault, Carignan e Syrah, e as brancas Clairette, Ugni Blanc, Bourboulenc e Marsanne.
Segundo Ravier seus vinhedos são orgânicos e biodinâmicos, embora não busque certificação, pois quer mater sua liberdade. Fazem seleção massal (não usam clones) e as leverudas são nativas (só no rosé são selecionadas). Os tintos não amadurecem jamais em barricas, mas em grandes tonéis usados de 5 a 8 mil litros, por 18 a 20 meses. As jóias da família são 3 crus excepcionais, chamados de La Migoua, La Tourtine e Cabassaou. Todos de vinhedos únicos de ao menos 40 anos de idade, em solo ariglo-calcário, que variam em sua composição, altitude e corte de uvas (veja mais detalhes nas provas que se seguem):
Provas
Das amostras de tonel brilharam os crus da safra 2013, La Migoua, Cabassou e neste estágio inacabado, o que mais encantou foi o La Tourtine. No geral os vinhos tem todos um perfil rústico com taninos e acidez nervosos, cheios de personalidade.
Elaborado a partir de vinhas de cerca de 20 anos, com 60% Clairette, 18% Ugni Blanc, 19% Bourboulenc e 3% Marsanne, 100% desengaçadas, com pré-fermentação pelicular a frio, malo-lática e amadurecimento em tonéis por 8-10 meses. Cor palha claro. Aroma de médio ataque mais delicado, cítrico, lima, pera, grama cortada, ervas. Paladar macio, com textura macia, fresco, 13,5% de álcool. acidez muito boa
Nota: 88 pontos
Elaborado a partir de vinhas de cerca de 20 anos de idade, com 50% Mourvèdre, 28% Grenache, 20% Cinsault e 2% Carignan. Feito por pressurage direct com 5% de sangria, sem passagem por madeira, um terço do vinho faz a malo-lática, 50% do vinho faz maceração pelicular a frio. Cor de pêssego, mais escuro dos que os exemplares da Cõte de Provence. Aroma não muito expressivo, mas personalíssimo, bastante floral e mineral, com de rosas secas, hibisco e giz. Paladar estruturado com uma fantastica textura, cremoso, com boa profundidade e boa acidez. São declarados 13,5% de álcool no rótulo, mas Daniel Ravier me confidenciou que é bem mais. Final com agradável nota de amargor, gastronomico. Um dos melhores rosados que já provei.
Nota: 92 pontos
Elaborado a partir de vinhas de mais de 40 anos, com 75% Mourvèdre, 14% Grenache, 9% Cinsault e 2% Carignan. Aroma intenso e rico, com certa rusticidade dada por notas animais de couro, fruta doce, cassis, ervas da Provence, mineral terroso. Paladar encorpado, com taninos secantes, 14% de álcool, mas final muito elegante
Nota: 91 pontos
Domaine Tempier La Migoua 2012
Elaborado a partir de vinhas de mais de 40 anos, com 50% Mourvèdre, 20% Grenache, 26% Cinsault e 4% Syrah. De cor escura, granada-violácea. Aroma de médio ataque, com notas de caldo de carne, ervas maceradas, frutas negras, cereja, alcaçuz, fundo mineral. Paladar estruturado e elegante, com 14,5% de álcool, com taninos finos e presentes e ótima acidez.
Nota: 93 pontos
Domaine Tempier La Tourtine 2012
Elaborado a partir de vinhas de mais de 40 anos, com 80% Mourvèdre, 10% Grenache e 10% Cinsault. Cor muito escura, opaca. Aroma concentrado e frutado, com notas de ameixas, cerejas negras, cassis, cedro, muitas ervas, alecrim, oregano,lavanda,. Paladar encorpado, com 14,5% de álcool, taninos finos e presentes, ainda jovem e nervoso. Grande vinho.
Nota: 95 pontos
Domaine Tempier Cabassaou 2012
Elaborado a partir de vinhas de mais de 50 anos, com 95% Mourvèdre, 4% Syrah e 1% Cinsault. De cor muito escura e aromas com bem mais especiarias e frutas mais maduras. Paladar encorpado, com 14,5% de álcool, mais dendo madudo, mais firme e mais longo. Igualmente excepcional mas totalmente diferente do La Tourtine.
Nota: 95 pontos
Domaine Tempier La Migoua 2005
Já chegando a sua 1a década de vida, com alguma evolução embora ainda com mais décadas pela frente. Granada entre claro e escuro. Aroma com notas de evolução, pele de salame, bacon, fumé, couro, frutas secas, creme de cassis. Paladar não corresponde ao nariz, pois ainda é jovem e nervoso, muito seco, taninos ainda secantes, com boa acidez, 14,5% de álcool.
Nota: 94 pontos
Domaine Tempier tinto 1987
Caminha para sua terceira década e chegando a maturidade. Cor granada clara, parecendo cor de borgonha evoluído. Aroma com muita evolução, com notas animais, couro, salame e muitas especiarias, ervas secas, nota quimica e iodo e de resinas. Paladar pronto mas com taninos ainda moderadamente presentes e secante.
Nota: 93 pontos
Château de Pibarnon
Não foi fáci chegar neste Château sem um 4x4. A longa, estreita, inclinada e curvilínea estrada de terra que leva até o topo da Colline du Télégraphe, 300 metros acima do nivel do mar (que fica logo ali adiante), deixa qualquer um morrendo de sede. Esforço recompensado. Sede aplacada com uma vertical desde 1996 até 2012.
Fundado em 1977, o Château de Pibarnon (www.pibarnon.com, representado no Brasil pela Zahil - www.zahil.com.br) tem seus 27 hectares de vinhedos em um terroir privilegiado. Em forma de anfiteatro, estes são os vinhedos mais altos de Bandol, de solo argilo-calcário ideal para a Mouvèdre, em um microclima entre o mar e morros que protegem do forte vento Mistral. Os métodos não diferem muito dos usados na Domaine Tempier. Com apenas 35hl/ha de rendimento médio, os vinhedos são organicos e e biodinamicos, mas sem certificação. As uvas são 30%-50% desengaçadas. Após fermentado em inox o vinho amadurece em grandes tonéis usados por cerca de 18 meses. No geral os tintos, elaborados com 90% Mourvèdre e 10% Grenache, trazem todos os taninos, potência, longevidade e perfil aromático dos melhores Bandol, agregando uma elegância sem par na região.
PROVAS
Elaborado com 60% Mourvèdre e 40% Cinsault. Um rosé de cor mais carregada, em tons de casca de cebola. Aroma vinoso, frutado, com notas de marmelada, rosas, meloa madura e framboesas. Paladar encorpado, macio, largo, com 13,5% de álcool. Excelente, em um estilo mais potente.
Nota: 88 pontos
Les Restanques de Pibarnon 2011
Feito com 70% Mourvèdre e 30% Grenache de vinhas mais jovens. Um vinho mais macio e mais acessível, feito para ser bebido jovem, embora possa ser guardado uns 5 anos. Rubi escuro violáceo, com o mesmo perfil dos demais tintos, só que bem mais leve e frutado. Aromas de frutas negras, pimenta, especiarias. Fácil de beber, delicioso, realmente se encaixa na proposta.
Nota: 88 pontos
Elaborado com vinhas de 45 anos de idade, com 90% Mourvèdre e 10% Grenache. Aroma elegante, bastante floral, com frutas maduras, especiarias e típica nota animal. Paladar mais elegante edelicado que o 2011, macio, de médio corpo, 14% de álcool, com menos taninos e acidez.
Nota: 89 pontos
De cor granada-violáceo muito escura. Bem mais concentrado no nariz e boca que o 2012, mas ainda asssim com taninos doces (para o padrão de Bandol), com notas de violetas, ameixas, tipica nota de carne, salame, mineral terroso, 14% de álcool.
Nota: 92 pontos
Um grande ano, que mesmo mais velho mostra mais mais frescor e muita elegância, com o
mesmo caracter. Menos fruta e concetração que o 2011, mas mais equilibrio e finesse. Enquanto o nariz mostra algumas notas de evolução, no paladar está impávido, ainda muito jovem e cheio de energia. Para longa guarda.
Nota: 93 pontos
Château de Pibarnon 2009 tinto
Um Pibarnon mais expressivo no nariz (embora a Mourvèdre seja mais expressiva na boca que no nariz), fruto de um ano mais quente e de maturação precoce. Um vinho concentrado, mas ao mesmo tempo mais fácil de beber, frutado, expressivo no nariz e boca. Não há pressa em beber, mas não parece ser para longa guarda.
Nota: 91 pontos
Ainda jovem na cor, rubi escuro reflexos granada. Aroma de boa concentração, com muita frura, notas de alcaçuz, couro, tabaco, especiarias. Paladar com taninos presentes, 14% de álcool, mas já bastante bebível, em um ótimo momento para consumo.
Nota: 92 pontos
Granada alaranjado entre claro e escuro. Aroma muito evoluído, de couro, salame, iodo, remedio, cedro, tabaco, licores, kirch, cola, resina. Paladar firme, com 14% de álcool, taninos prontos, macio, mas firmes e com frescor. Diferente, interessante.
Nota: 92 pontos
Parece mais novo que o 2001, especialmente no nariz, com menos notas de evolução. Nariz concentrado, com notas de alcaçuz, frutas secas, especiarias. Paladar seco, taninos finos ainda presentes, 14% de álcool, com tipicidade e frescor. O melhro da prova, com vida pela frente
Nota: 94 pontos
Boas opções disponíveis no Brasil
Bandol 2005, Domaine Sorin, Provence- França (Decanter, www.decanter.com.br).
Elaborado com 85% Mourvèdre, 10% Syrah e 5% Carignan, fermentado em foudres, com 16 meses em barricas de carvalho francês. Grana- da escuro. Com aroma intenso e complexo,com muitas ervas aromáticas, couro, frutas secas, passas, muitas especiarias. Paladar encorpado e estruturado, com 13% de álcool, taninos finos e macios, com acidez equilibrada. Está em um excelente momento para consumo, chegando ao seu auge em seu 10o ano de idade, ainda devendo se manter por mais alguns anos.
Nota: 91 pontos
Château Vannières 2007, Château Vannières, Provence-França (Mistral, www. mistral.com.br).
Elaborado com 95% Mourvèdre e 5% Grenache, amadurecido em tonéis e barricas por 20- 24 meses. Muito escuro, quase opaco. Aroma complexo, com notas de especiarias, couro, ce- rejas, ameixas, creme de cassis, cedro, pimenta. Paladar de bom corpo (sem exageros), macio, com taninos finos, 15% de álcool e acidez mui- to boa. Excelente, tem equilíbrio e estrutura para longa guarda.
Nota: 92 pontos
Bandol 2010, Hecht & Bannier, Provence- França (Vinci, www.vinci.com.br)
Elaborado com 80% Mourvèdre e 20% de Grenache e Cinsault, com 20 meses em foudres. Cor rubi violácea muito escura. Aroma intenso e frutado, com notas de ameixas, amoras, cou- ro, especiarias. Paladar encorpado, com taninos finos bem presentes, boa acidez e ótimo fres- cor, 14% de álcool. Ainda jovem, deve crescer bastante com alguns anos de guarda.
Nota: 90 pontos
Veja também Viagem a borgonha com Marcelo Copello